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Queridos leitores

Como vocês já devem ter percebido, o blog Conflitos & CIA. ILTDA. não está sendo mais atualizado.

Talvez possa interessá-los o blog Mediar Conflitos (www.mediarconflitos.com) , que trata, entre outros assuntos, da mediação de conflitos.

Obrigada por terem nos acompanhado até aqui!

16.12.06

Conflitos conjugais e infidelidade (parte IV)

No site do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) está uma reportagem, reproduzida abaixo, sobre o tema da infidelidade com a antropóloga e professora da UFRJ Mirian Goldenberg, que lançou em 2006 o livro “Infiel – Notas de uma Antropologia”:

"Que seja eterno enquanto dure". Assim o poeta Vinicius de Moraes, homem de vários casamentos, traduziu o sucesso momentâneo dos relacionamentos. Motivo de muitos términos, a infidelidade é tema de rodinhas de amigos e de estudos acadêmicos, como o da antropóloga e professora da UFRJ Mirian Goldenberg. Goldenberg lançou recentemente o livro "Infiel", pesquisa que analisa a vida sexual e conjugal do brasileiro.

Segundo a autora, o conceito de infidelidade é entendido de diversas maneiras entre homens e mulheres, mas ambos associam a traição sexual como a grande culpada. "Isso porque as pessoas querem ter a sensação de serem únicas e quando descobrem a traição, entendem que não são tão especiais na vida do seu parceiro ou parceira", conta a antropóloga. O resultado é uma grande confusão de sentimentos e que costuma acabar em separação.

Homens e mulheres reagem de maneiras diferentes

Miriam Goldenberg diz que o homem costuma não querer saber se a parceira o está traindo. De acordo com a antropóloga, ele prefere acreditar na fidelidade feminina e fazer vista grossa para determinados acontecimentos. "Quando os homens descobrem que foram traídos é um grande drama", diz ela.

Diferentemente do homem, a mulher acredita que seus parceiros são sempre possíveis traidores. Motivo pelo qual muitas mulheres fuxicam o celular dos maridos, a conta do cartão de crédito e as contas de e-mail. Resultado: as mulheres logo pedem separação quando descobrem a infidelidade.

Por que as pessoas traem? A pergunta que não quer calar.

A mulher costuma trair porque está insatisfeita no casamento. Já o homem pode estar satisfeito com a relação, mas trai assim mesmo. "Ele separa sexo e afeto e acha que não tem nada a ver com o casamento", explica Goldenberg. Essa diferença no modo de pensar se deve a cultura da nossa sociedade e nada tem a ver com genética humana". Para a antropóloga, as mulheres têm a mesma capacidade dos homens de separar sexo do afeto, mas não na cultura em que vivemos. "O homem acha que tem o direito adquirido para a traição porque tem uma natureza poligâmica. E a mulher tende a se controlar mais no seu comportamento e no seu discurso. É mais complicado a questão da traição para as mulheres", diz ela.

Homens traem mais do que as mulheres. Será?

Goldenberg entrevistou 1279 pessoas e constatou que a emancipação da mulher e as mudanças culturais relativas estão dando mais liberdade e independência para as mulheres, que se tornam mais exigentes e também mais insatisfeitas do que o homem no casamento.

No discurso dos entrevistados, a pesquisa revelou que 60% dos homens já traíram, enquanto 47% das mulheres confessaram a infidelidade. Apesar desses números, a própria pesquisadora esclarece que esse número pode não ser verdadeiro, já que os homens tendem a aumentar e as mulheres a diminuir seus relacionamentos e puladas de cerca conjugais.

A fidelidade existe?

É difícil, mas sim. Pelo menos essa é a visão da antropóloga Mirian Goldenberg, que faz uma ressalva: "A fidelidade existe, só que é complicado o que significa para cada um. Eu posso achar que sou fiel não sendo considerado fiel pelo outro. Se os dois entendem fidelidade e infidelidade do mesmo modo, podemos dizer que a fidelidade existe sim".

Afinal, o que os homens e as mulheres querem?

Goldenberg diz que existem vários modelos de relacionamentos, mas basicamente os que os homens querem é compreensão. A mulher, segundo ela, quer tudo e muito mais. "As mulheres são umas eternas insatisfeitas", completa a autora.

3.11.06

Novas reflexões sobre a infidelidade

Uma das finalidades do blog é a troca de experiências e de conhecimentos e a possibilidade de uma maior interação entre aquele que escreve e aquele que lê. Portanto, fico muito satisfeita quando percebo que o blog está atingindo seus objetivos. No dia 31.10 recebi um e-mail muito interessante da terapeuta Keyla Matias sobre o tema da infidelidade conjugal que merece ser publicado (com a permissão prévia da remetente). Vale a pena clicar no link “Leia mais...” abaixo e ver o post na íntegra.

Cara Lisiane,

visito seu blog Conflitos & CIA com freqüência e gostaria de falar, inicialmente, que acho tudo muito interessante.
Você escreve muito bem e aborda os temas de forma a deixar os leitores interessados.
Particularmente, com relação ao seu tema mais recente, Infidelidade Conjugal, achei os textos (e o tema) muito interessantes.
Este e-mail, na verdade, é para dar uma sugestão com relação ao mesmo.
Sou terapeuta e, em uma troca de e-mails sobre este assunto com Contardo Calligaris (psicanalista e autor de uma coluna às quintas-feiras para a Folha de São Paulo), ele me enviou um e-mail com opiniões que acho importantes serem discutidas a este respeito.
Estávamos discutindo a função da internet nos conflitos e na infidelidade conjugal, e a decorrente possibilidade de manutenção de um contato entre a pessoa que traiu e o parceiro de caso, contato este escondido ou não do parceiro de casamento.
Ele me respondeu assim:

Oct 24, 2006

"Cara Keyla,

Minhas opiniões com relação a um possível contato entre a pessoa que traiu e o parceiro de caso não vão ser muito diferentes das dos outros colegas de profissão.
Claro que os contatos, mesmo virtuais, são um desastre para o casamento.
O fato central dentro desta situação é que o/a marido/esposa não está disposto a parar (eu apostaria: nem tanto a parar aquele relacionamento, mas a parar de ter um segredo, uma vida um pouco ou muito paralela).
Essa situação não é rara; a internet a permite e encoraja (o que, às vezes, é destrutivo e, outras vezes, ao contrário, funciona como uma válvula de escape para qualquer um dos dois).
A questão para o parceiro desta pessoa é, no fundo: será que ele(a) aguenta conviver com alguém que só consegue ficar casado à condição de ter algumas gavetas das quais só ele(a) tem as chaves? Difícil decisão...

Um grande abraço,

Contardo Calligaris"

Achei que seria interessante compartilhar esta opinião, central para o tema que você está discutindo. Principalmente porque os livros e textos da área não consideram a possibilidade de manutenção de um contato entre a pessoa que traiu e o parceiro de caso, e o quanto este contato pode ser danoso para o casamento, especialmente no restabelecimento da confiança entre os cônjuges.
Espero ter sido de alguma contribuição.

Abraços,

Keyla Matias


Em e-mail posterior (03.11), Keyla acrescenta:

Acho a opinião do Contardo brilhante e a forma como ele coloca a idéia de que o marido/esposa que continuam com um contato (mesmo que casual) com o ex-parceiro de caso necessita manter uma "vida paralela", escondida do cônjuge, como se numa tentativa de continuar sendo solteiro/a. Nestes casos, acredito que a pessoa não estava preparada para o casamento. Alguns podem acreditar que isso é apenas uma manutenção da sua "individualidade" e "autonomia", tão valorizadas nos dias de hoje. No entanto, é preciso enfatizar que um contato entre estas partes (pessoa que traiu e ex-parceiro de caso) está diretamente ligado ao nível de comprometimento da pessoa com o seu casamento. Há outras formas de se manter a individualidade sem precisar acabar com o casamento; mentir e fazer seu marido/esposa sofrer em nome dessa "autonomia" não são opções.

Afinal, quando duas pessoas se casam, elas estão selando um pacto em que dizem, implicitamente, que querem ser felizes juntas e não "eu quero ser feliz, não me importa se você esta feliz ou não". A pessoa que traiu precisa dar ao cônjuge a certeza de que estará ao lado dele(a) e que essa relação e mais importante do que qualquer outra.

Sem essa certeza e com a manutenção desse contato é impossível pedir que o cônjuge confie em você. Como confiar se o outro não está disposto a fazer os sacrifícios necessários para que esta confiança (e o casamento) seja restabelecida?
Outro ponto que acho importante considerar e que normalmente, nestas situações, a pessoa que traiu não se coloca no lugar do cônjuge, procurando entender seus sentimentos. Neste sentido, a melhor coisa a se fazer é tentar fazer este exercício de pensar "se eu fosse a pessoa traída, eu aceitaria isso? aceitaria que ele(a) tivesse um contato (virtual ou não) com a outra pessoa?".

Normalmente, na maioria dos casos, a resposta é não. Ele(a) nunca aceitaria essa possibilidade e acharia impossível perdoar o outro. E então, como eles estão pedindo que o outro aceite algo que nem eles mesmos aceitariam?


Keyla, muito obrigada por sua contribuição!

6.9.06

Conflitos conjugais - infidelidade (II)

Imagem: Obra de René Magritte. Os Amantes (1928).

Sete mitos sobre a infidelidade conjugal

“Há muita bobagem na mitologia popular sobre os casos extraconjugais”, afirma o psiquiatra Frank Pittman. Em seu livro “Mentiras Privadas”, são destacados alguns mitos sobre a infidelidade:

  1. Todas as pessoas são infiéis; esse é um comportamento normal, esperável.
  2. Os casos fazem bem a você; um caso pode inclusive fazer reviver um casamento monótono.
  3. O infiel certamente não “ama” aquele que foi traído; o caso prova isso.
  4. O parceiro do caso deve ser mais “sexy” do que o cônjuge.
  5. O caso é culpa da pessoa traída, prova de que ela falhou à pessoa infiel de alguma maneira que tornou o caso necessário.
  6. A melhor abordagem à descoberta do caso de um cônjuge é fingir não saber, evitando, dessa forma, uma crise.
  7. Se acontece um caso, o casamento deve terminar em divórcio.

“Todas essas idéias, como o proverbial relógio parado, estão certas de vez em quando”, salienta Pittman, mas, na grande parte dos casos, são observações enganosas.

O autor sugere a substituição dos mitos acima por um outro conjunto de generalizações, bem diferente:

1. A infidelidade não é um comportamento normal, mas um sintoma de algum problema.
Uma boa parte da infidelidade ocorre no último ano de um casamento falido. De acordo com Pittman, a fidelidade conjugal continua sendo a regra, uma vez que a maioria dos parceiros é fiel a maior parte do tempo.

2. Casos são perigosos e podem facilmente, e inadvertidamente, acabar com casamentos.
Ter um caso para criar uma crise a partir da qual o casamento possa se beneficiar é uma abordagem exótica para resolver o problema, afirma o psiquiatra.

3. Casos podem ocorrer em casamentos que, antes do caso, eram bastante bons.
A infidelidade não é uma questão de amar ou não amar, e sim de escolha, ou seja, se o comprometimento com o casamento foi ou não foi abandonado, se a pessoa “sente-se casada” ou não. “Esse comprometimento parece um tanto independente das emoções do momento e pode ter muito mais a ver com a escolha do cônjuge de sua própria identidade e sistema de valores”, esclarece Pittman.

4. Casos envolvem sexo, mas o sexo geralmente não é o propósito do caso.
“Os parceiros de caso não são escolhidos por serem campeões de um torneio sexual. Eles são escolhidos por muitas razões estranhas e geralmente não-sexuais. As escolhas de caso são geralmente mais neuróticas do que as escolhas de casamento”, observa o autor, através de sua experiência em atendimento a casais. Acrescenta, ainda, que a escolha do parceiro do caso pode se basear mais na diferença em relação ao cônjuge do que na superioridade em relação a ele.

5. Ninguém pode levar uma outra pessoa a ter um caso.
Como bem afirma Pittman, “A insatisfação em um casamento pode ou não ser um esforço conjunto, mas as decisões sobre como lidar como uma situação intolerável são claramente individuais”. Existem diversas opções a uma relação conjugal insatisfatória ao parceiro descontente: uma discussão, terapia, divórcio, etc. A infidelidade não é uma fatalidade, é uma livre escolha; sua responsabilidade não pode ser atribuída ao cônjuge traído.

6. Casos são alimentados pelo segredo e ameaçados pela exposição.
“O poder de um caso pode estar no seu segredo. A fragilidade de um casamento pode estar na evitação dos problemas”, sugere o autor. “Muitos – às vezes eu acho que a maioria – preferem não estar bem casados, manter alguns limites à intimidade e ao ‘estar juntos’. Eles se esforçam por manter a distância certa no relacionamento. O caso pode ser um auxílio para manter essa distância”, acrescenta.

7. Casamentos podem, com esforço, sobreviver aos casos se estes forem expostos.
Os casamentos podem se recuperar de casos, mas isso envolve um grande trabalho e sofrimento. “Algumas pessoas se separam depois de um caso, outras permanecem casadas, punitivas e infelizes, e outras usam o caso como uma crise a partir da qual podem produzir um casamento mais satisfatório, seja ele mais ou menos íntimo do que antes, mais ou menos exclusivo”, salienta Pittman. “Eu raramente vi um casal em terapia divorciar-se por causa de um caso que agora está terminado. Isso acontece rotineiramente em casamentos que não estão em terapia”, salienta.

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Referência
PITTMAN, Frank. Mentiras privadas: a infidelidade e a traição da intimidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.


30.7.06

Conflitos conjugais - infidelidade


Um dos maiores conflitos que pode ocorrer entre um casal diz respeito à infidelidade. Embora existam crenças - supostamente fundadas na biologia - de que o macho teria uma tendência natural a espalhar sua “semente” e, portanto, à traição da parceira, na própria natureza podem ser encontrados casos significativos de fidelidade. As araras azuis, por exemplo, mantêm fidelidade incondicional à relação até a morte de um dos parceiros, e dividem todas as tarefas de cuidar dos filhotes.

Na diversidade da espécie humana, pode haver várias atitudes com relação à questão da monogamia e da fidelidade, como expõe, de forma bastante espirituosa, o psiquiatra norte-americano Frank Pittman (1994, p. 60):

O que é natural para os seres humanos? Com que animais parentes nós mais nos parecemos: gibões, gorilas, orangotangos ou chimpanzés? Os gibões são tão monógamos que afugentam todos os intrusos, incluindo seus próprios filhos. Os gorilas são polígamos; [...] Os orangotangos são solitários e anti-sociais, mas ocasionalmente se encontram na floresta. Os chimpanzés são promíscuos [...]. Todos nós conhecemos pessoas que seguem alguns desses padrões; elas acham seu padrão tão natural quanto seus modelos primatas devem achar.


As reações frente à infidelidade também podem ser as mais diversas: ciúme intenso; sentimento de traição mesmo entre companheiros ou cônjuges que se desprezavam há muito tempo e evitavam qualquer contato físico entre si; imprevistas expressões de afeto por parte daquela pessoa que foi traída (levando ao indivíduo “traidor” a modificar seu projeto de abandono do lar); perda de perspectiva e responsabilidade e conseqüente desejo de vingança; raiva intensa, mesmo por parte daquele(a) que já traiu no passado, entre muitas outras (Nabarro e Ivanir, 2002).


Há um consenso entre os estudiosos sobre o assunto de que, se a relação entre o casal é suficientemente afetuosa e satisfatória, é possível superar a crise provocada pela infidelidade. Deve se ter em mente que a infidelidade é uma questão delicada e deve ser tratada na complexidade e peculiaridade de cada caso:

Não existe um caso típico de casal em crise devido a uma relação extraconjugal. Essas relações assumem uma grande variedade de formas e são conduzidas de modos diversos. Os significados a elas atribuídos e as motivações subjacentes são muitos, variados, assim como as circunstâncias da descoberta e dos efeitos subseqüentes. Os comportamentos são fortemente influenciados por diversos fatores: a fase em que se encontra o casal em seu ciclo de vida e de casamento, as dinâmicas individuais e de casal, o sistema de valores e o ambiente sociocultural em que a relação se dá (Nabarro e Ivanir, 2002).


Referências
PITTMAN, Frank. Mentiras privadas: a infidelidade e a traição da intimidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.

NABARRO, Noga Rubinstein; IVANIR, Sara. A terapia dos casais de meia-idade em crise devido a uma relação extra-conjugal. In: ANDOLFI, Maurizio (org.). A crise do casal: uma perspectiva sistêmico-relacional. Porto Alegre: Artmed, 2002. p. 29-72.

11.7.06

O caminho ideal da gestão de conflitos familiares


O processo de gestão de conflitos familiares ideal está representado pela figura acima, cuja orientação segue as setas circulares em cinza.

Assim, se passamos por um conflito familiar (como, por exemplo, uma separação conjugal), primeiro deveríamos tentar o diálogo. A comunicação é um dos pontos-chave para se resolver um conflito de forma satisfatória para todos nele envolvidos. Na verdade, manter um diálogo em que se possa enviar e captar mensagens de forma compreensível e empática é uma árdua tarefa, um dos caminhos mais difíceis – e, por isso mesmo, o mais abandonado.

Na realidade, mesmo se a comunicação está inviabilizada, há alternativas anteriores ao ingresso na Justiça. Quando a pessoa está muito fragilizada pelo estresse envolvido em um conflito, pode buscar um apoio psicoterapêutico. Se o casal se encontra ambivalente com a separação, por exemplo, pode se beneficiar de uma terapia conjugal. Mesmo quando a decisão relativa à separação já está tomada, o casal pode recorrer a uma “terapia do divórcio”. Quando o conflito envolve mais membros do grupo familiar, uma terapia de família pode ser de grande auxílio.

De forma ideal, somente depois de tentar o diálogo e a ajuda terapêutica é que a(s) pessoa(s) em conflito familiar deveria(m) buscar a via jurisdicional. Por quê? Porque, dessa forma, o conflito já estará amadurecido, e a demanda judicial não será um subterfúgio para manter um vínculo emocional (positivo ou negativo). Dessa maneira, também, os filhos (no caso de uma separação) não representarão um “cabo de guerra” entre os pais.

Existem, basicamente, duas maneiras de se ingressar em juízo no caso de conflitos familiares: uma consensual e outra não-consensual. O método consensual envolve tentativas de ambas as pessoas em conflito de entrarem em um acordo sobre o objeto da demanda judicial. Pode ser extrajudicial, quando ocorre antes do ingresso na Justiça, ou judicial, no momento ou após o ingresso na Justiça. Um dos exemplos de método consensual de gestão de conflitos familiares é a mediação.

Esse método consensual deveria ser buscado antes do não-consensual, em que se prioriza o litígio e há um extremo antagonismo entre as pessoas envolvidas no conflito e uma contrariedade à negociação.

Naturalmente, toda regra comporta sua exceção. Existem situações em que o “caminho ideal da gestão dos conflitos familiares” não pode ser seguido. É o que ocorre, por exemplo, em casos de violência intrafamiliar, que desde logo requerem uma medida judicial para afastamento do ofensor do lar. Nos demais casos, no entanto, o referido caminho poderia ser trilhado.

Infelizmente, devido à “cultura do litígio” em que vivemos, freqüentemente as pessoas preferem cortar a comunicação e delegar ao poder jurisdicional do Estado as suas decisões.

É mais fácil projetar nossos erros nos outros e na situação externa do que procurar as falhas dentro de nós mesmos. Porém, agindo dessa forma, estaremos perdendo uma valiosa oportunidade de crescimento pessoal (quem disse que crescer não dói?).

6.7.06

A percepção conflituosa da realidade



Frente a um conflito familiar, o que fazer?

Existem diversas formas de se lidar com uma situação conflituosa. É muito importante ter isso em mente, pois muitas vezes, quando passamos pelo estresse de um conflito, nossa percepção se fecha e só conseguimos visualizar poucos caminhos à nossa frente. É como se uma forte neblina escondesse as placas de sinalização e só conseguíssemos ver a estrada que se mostra mais acessível e vantajosa no momento. Nessas horas é sempre bom nos questionarmos:

Essa parece ser a melhor alternativa agora, mas e depois? Daqui a alguns meses ou anos, continuará sendo a escolha mais adequada?

Os conflitos familiares freqüentemente estão carregados de sentimentos de raiva, frustração, de luta pelo poder, de busca de vingança, enfim, de demandas emocionais que são capazes de transformar uma situação que poderia ser resolvida através de um diálogo em uma verdadeira batalha judicial.

Somos seres humanos, sujeitos a falhas. Nossa percepção da realidade, por mais verídica que pareça, é apenas a NOSSA percepção, permeada pelas nossas emoções, racionalizações, enfim, pelas nossas histórias de vida. O mesmo ocorre com a outra pessoa que está em conflito conosco, que também possui suas percepções e limitações.

Como lembra Humberto Maturana (2001, p. 160):

Considero que o maior perigo espiritual que uma pessoa enfrenta em sua vida é o de acreditar que ele ou ela é a dona de uma verdade, ou a legítima defensora de algum princípio, ou a possuidora de algum conhecimento transcendental, ou a dona, por direito, de alguma entidade, ou a merecedora de alguma distinção, e assim por diante, porque ele ou ela imediatamente torna-se cega para a sua condição, e entra no beco sem saída do fanatismo.
Também considero que o segundo maior perigo espiritual que uma pessoa enfrenta em sua vida é o de acreditar, de uma forma ou de outra, que ele ou ela não é totalmente responsável por seus atos, ou por desejar ou não as suas conseqüências.

___________
Referência:
MATURANA, Humberto. Cognição, ciência e vida cotidiana. Belo Horizonte: UFMG, 2001.

3.7.06

Como você lida com os conflitos?


Frente a um conflito, você tende a evitá-lo, de forma ansiosa como o assustado animalzinho ao lado? Ou, ao contrário, não teme “barracos” e aguça ainda mais as divergências em conflito?

Na realidade, apesar de poder haver um estilo pessoal de abordar um conflito, existem vários fatores que interferem na nossa escolha de uma determinada atitude frente a uma situação conflituosa:

  • A natureza desse conflito;
  • As suas razões subjacentes;
  • O contexto em que ocorre;
  • O comportamento do “oponente”;
  • As experiências anteriores que tivemos com relação aos conflitos e seus resultados.

Algumas atitudes que podem surgir frente a um conflito:

  • Evasão: evitação do conflito a qualquer custo;
  • Repressão: controle do conflito pela força;
  • Acomodação: preferência pela aceitação ou concordância superficial;
  • Confrontação: discussão aberta das discordâncias, com um aumento das divergências;
  • Negociação: busca de uma solução intermediária;
  • Colaboração: busca de uma solução válida para todos.

Não se pode dizer que existe uma atitude totalmente certa ou errada para gerir um conflito. Dependendo da situação, determinado tipo de abordagem pode se mostrar mais adequada do que outra. Evitar um conflito, por exemplo, pode ser apropriado quando o assunto é pouco significante ou existe falta de informação, ou quando outro indivíduo seria mais indicado para resolver melhor o problema.

Portanto, por mais estranha que pareça a reação de uma pessoa frente a determinada situação conflituosa, pode ser que tenha sido a melhor alternativa que ela encontrou no momento. O nosso amiguinho peludo (acima) que o diga... Talvez não estivesse em um de seus melhores dias. Talvez tivesse tomado muita cafeína. Talvez essa fosse a sua reação costumeira frente a situações de estresse. Quem sabe?

E você? Qual a sua reação frente a um conflito? Já parou para pensar sobre isso?

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Foto: Flipped Out



13.6.06

Métodos de gestão de conflitos

Há basicamente dois métodos de resolução/gestão de um conflito, que podem ser resumidos a seguir:

1. Método Não-Consensual
  • As pessoas envolvidas não estão dispostas a negociar e chegar a um acordo.
  • Prioriza o litígio.
  • Sistema ganhar-perder: há sempre um ganhador e um perdedor.
  • Ex: ação de separação judicial litigiosa.
2. Método Consensual
  • Existe uma disposição ou uma capacidade das pessoas para discutir sobre as questões em conflito e chegar-se a um consenso.
  • Prioriza o acordo.
  • Sistema ganhar-ganhar: os envolvidos saem, de alguma forma, beneficiados.
  • Ex: ação de separação consensual, mediação de conflitos.
Deve ser oportunizada uma ampla orientação sobre tais métodos à pessoa em conflito, para que seja capaz de verificar qual a opção mais adequada ao seu caso.

Além disso, não se pode esquecer que:

“Visto numa perspectiva de resolução de problemas, o conflito torna-se, com freqüência, um aspecto do processo de autotestagem e auto-avaliação da pessoa e deste modo pode ser bastante agradável experimentar o prazer advindo do uso ativo e pleno de suas próprias capacidades” (Moscovici, 1998, p. 154)
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Referência
MOSCOVICI, Felá. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 8. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998.

8.6.06

Uma visão integral do conflito


A saúde nas relações familiares não é medida através da ausência de problemas ou de conflitos. Ao longo do ciclo de vida da família, existem muitos estressores, basicamente de dois tipos (Carter e McGoldrick, 1995):

1. Estressores verticais --> padrões de relacionamento e funcionamento que são transmitidos para as gerações seguintes. Inclui atitudes, mitos, tabus, expectativas, rótulos, segredos e questões opressivas familiares.

2. Estressores horizontais --> ansiedades produzidas na família conforme ela avança no tempo. Podem ser de dois tipos:
  • Desenvolvimentais: dizem respeito às transições do ciclo de vida familiar (às diversas fases pelas quais uma família pode passar, como por exemplo, o novo casal, as famílias com filhos pequenos, as famílias com filhos adolescentes, o “ninho vazio”, o envelhecimento, o divórcio, o recasamento, etc).
  • Impredizíveis: relacionados a fatos inesperados, como morte precoce, doença crônica, acidente.
Além desses estressores, não se pode deixar de considerar o impacto do contexto social, econômico, político e cultural sobre a família. Assim, como destaca Walsh (2002, p. 20), “as variações inesperadas na rotina, as crises e as eventuais responsabilidades que se somam exigem flexibilidade e tolerância para o caos que ocasionalmente pode se produzir”.
Mas nem sempre essa “flexibilidade” e “tolerância” são metas fáceis de serem alcançadas, de forma que muitas vezes os membros integrantes das famílias se vêem obrigados a buscar ajuda profissional, seja na área psicológica, seja na jurídica. Conhecer um pouco das vicissitudes dos conflitos familiares é uma forma de os profissionais conseguirem compreender melhor o seu papel frente à(s) pessoa(s) em conflito(s) em busca de uma pequena luz no fim do túnel – que, como todo túnel, possui uma penumbra apenas passageira.
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Referências
CARTER, Betty; MCGOLDRICK, Mônica. As mudanças no ciclo de vida familiar: uma estrutura para a terapia familiar. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
WALSH, Froma. Casais saudáveis e casais disfuncionais: qual a diferença? In: Andolfi, M. (org.). A crise do casal: uma perspectiva sistêmico-relacional. Porto Alegre: Artmed, 2002, p. 13-28.

* Paisagem fotografada por Lisiane L. K.

7.6.06

O caos como oportunidade de mudança

Chaos often breeds life, when order breeds habit.

Essa frase, de autoria do novelista e historiador americano Henry Adams (1858-1918), contém a idéia de que a vida é freqüentemente criada pelo caos, enquanto que a ordem cria o hábito - ou seja, as mudanças não surgem da “mesmice”. O caos, por mais desordenado e aleatório que pareça, na verdade possui uma ordem intrínseca e, por sua vez, produz uma nova ordem.
Segundo a nova ciência da complexidade, em muitos sistemas não-lineares (os sistemas vivos, por exemplo), pequenas mudanças em certos parâmetros podem produzir mudanças dramáticas nas suas características básicas. Esses sistemas são, portanto, essencialmente instáveis, e os pontos críticos de instabilidade são denominados “pontos de bifurcação”, nos quais o sistema pode ser empurrado em direção ao uma nova ordem (através da auto-organização) ou à desintegração. A nova percepção da ordem e desordem representa uma inversão das concepções científicas tradicionais, para as quais a primeira está associada com o equilíbrio, e a segunda com situações de não-equilíbrio (Capra, 2002).

Assim, utilizando-se da metáfora da teoria do caos, pode-se dizer que as “desordens” sofridas pelo sistema familiar provocam bifurcações rumo a novas ordens mais complexas, formando uma rica diversidade de relações, algumas aparentemente caóticas, mas que, na realidade, possuem suas ordens intrínsecas.Essa complexidade oferece uma falsa impressão de que as famílias podem estar desestruturadas ou até mesmo no seu limite de resistência quando, de fato, demonstram uma ampla capacidade de mudança e de “adaptação” ativa às novas tendências socioeconômicas e culturais.
As relações familiares, como todas as relações sociais, estão sujeitas a conflitos. O conflito, em si, não é patológico ou destrutivo, depende da forma como é tratado, de sua intensidade, do contexto. Como define Moscovici (1998, p. 146):
De um ponto de vista amplo, o conflito tem muitas funções positivas. Ele previne a estagnação decorrente do equilíbrio constante da concordância, estimula o interesse e a curiosidade pelo desafio da oposição, descobre os problemas e demanda sua resolução. Funciona, verdadeiramente, como a raiz de mudanças pessoais, grupais e sociais.
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Referências
CAPRA, Fritjof. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos seres vivos. 7. ed. São Paulo: Cultrix, 2002.
MOSCOVICI, Felá. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 8. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998.

* Paisagem fotografada por Lisiane L. K.